População e Meio Ambiente, um vínculo perdido
A partir de 1965, o Brasil inicia uma atrapalhada tentativa de controle populacional. No entanto, foi nos EUA que ideia teve origem. Logo após a Segunda Guerra Mundial, entre 1946 a 1964, houve um enorme aumento na taxa de natalidade nos EUA. Essa geração de americanos, estimada em 78 milhões, é conhecida como os Baby Boomers. As razões para esse aumento populacional são várias; as mortes de jovens americanos durante o período de guerra, a euforia econômica do país no pós-guerra, uma política natalista apoiada pela a ideia de que o crescimento populacional gera crescimento econômico e o avanço da agricultura e da medicina. A partir do início da década de 60, no entanto, começa a crescer a consciência de que o homem interfere na natureza e que uma população maior significaria um impacto ainda maior. Cenas de áreas de floresta sendo devastadas para dar lugar a bairros residenciais incentivaram a criação de grupos de pressão que pediam a redução da taxa de crescimento da população americana. Primeiramente encampada pelo Partido Democrata dos EUA, logo a questão populacional foi incorporada ao discurso dos republicanos. Em seguida, o tema foi tão politizado que o vínculo com os movimentos ambientalistas se perdeu. De um lado, o lobby das igrejas contrárias ao uso dos meios contraceptivos modernos e, do outro, grupos, como o Pantera Negra, que acusavam o governo de apoiar políticas eugênicas. Ou seja, todos sabiam que o crescimento demográfico tem grande relação com a degradação do meio ambiente, mas ninguém queria se arriscar a falar no assunto.
Selected Characteristics of Baby Boomers 42 to 60 Years Old in 2006
http://www.census.gov/population/www/socdemo/age/200620Baby%20Boomers.pdf
O Controle de Natalidade imposto pelo FMI
No Brasil, o planejamento familiar já chega com acusações políticas da direita à esquerda. A igreja e alguns setores da área militar, que consideravam o crescimento da população fundamental para ocupação do território brasileiro e a manutenção da soberania nacional, eram contrários ao planejamento familiar. As correntes de
esquerda afirmavam que os americanos temiam que o rápido crescimento populacional e o aumento da pobreza na América Latina tornaria o continente um barril de pólvora. E de fato, além da preocupação ambiental havia uma agenda política por trás das tentativas de controle populacional. O relatório confidencial de Henry Kissinger de 1974, tornado público em 2004, indica a possibilidade do surgimento de instabilidade política e distúrbios sociais em função do crescimento populacional e do consequente aumento da pobreza em 13 países de interesse estratégico para os EUA. O relatório também expõe a necessidade crescente dos EUA em importar recursos naturais, e, portanto, a importância de garantir a estabilidade política nesses países menos desenvolvidos. Também cita a instabilidade de uma nação com uma população predominantemente jovem.
National Security Study Memorandum 200 (NSSM 200)
Implications of Worldwide Population Growth
http://pdf.usaid.gov/pdf_docs/PCAAB500.pdf
Esterilizações no Brasil
Após a Revolução Cubana em 1959, os EUA apoiaram ditaduras militares em vários países da América Latina e condicionaram empréstimos do Fundo Monetário Internacional (FMI) à implantação de programas de controle populacional entre outras medidas. A saída do governo brasileiro foi implantar um programa dissimulado de planejamento familiar e fez vista grossa para as esterilizações cirúrgicas que ocorriam cotidianamente nos hospitais públicos e privados do país durante todo esse período.
Criada em 1965, a Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil, a Bemfam, o ícone máximo da intervenção controlista no Brasil, teve uma atuação inicial de distribuição de pílulas anticoncepcionais, mas a partir de 1974 estimulou partos cesarianos e financiou esterilizações em hospitais brasileiros. Conspirações à parte, é difícil acreditar que um país pobre, como era o Brasil na época, com um serviço precário de saúde pôde custear tantos partos cesarianos e esterilizações cirúrgicas sem que isso fosse realmente uma política de Estado.
Veja a matéria, Filhos da pobreza, na Revista IstoÉ:
http://www.istoe.com.br/reportagens/21681_FILHOS+DA+POBREZA?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage
A conquista dos direitos da mulher
Parece, então, um subterfugio falar em direitos da mulher. No entanto, em países onde não ocorreu a intervenção controlista, o direito ao planejamento familiar chegou como uma reinvindicação dos movimentos feministas. O governo francês, por exemplo, que impunha uma política natalista para aumentar sua população no
pós-guerra, só permitiu a liberação da pílula anticoncepcional em 1967 após a aprovação, em decorrência da pressão feminista, da Lei Neuwirth.
Interessante é que a pílula anticoncepcional, embora tenha revolucionado o comportamento da mulher moderna, faz parte também do imbróglio “controle de natalidade” e o planejamento familiar. O nome em inglês Birth Control Pills, Pílulas de Controle de Natalidade, significava que a mulher podia controlar sozinha, pela primeira vez, sem ajuda do parceiro, a sua fertilidade. No entanto, a pílula, misturada com o imperialismo americano, a ditadura militar, o FMI, o antiamericanismo da época, as acusações de eugenia, os enjoos provocados pelas altas doses de estrogênio contidas nas pílulas da época, ajudou a disseminar a cultura das cesarianas e das laqueaduras tubárias.
A intervenção americana, a partir dos anos 60, foi responsável por uma cultura de esterilizações cirúrgicas e cesarianas que perdura até hoje apesar do país já possuir um programa de planejamento familiar baseado no direito à saúde integral da mulher. Essa cultura perdura, principalmente, porque o país ainda tem um sistema de saúde pública muito aquém das necessidades da população no qual uma mulher pode levar meses para fazer exames simples e consultar um ginecologista e não possui um programa eficiente de educação sexual nas escolas brasileiras.
Livres da atuação política pela anistia e a redemocratização do país durante a Ditadura Militar, os movimentos feministas retornam à sua luta para a conquista dos direitos da mulher e já em 1983 é criado o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher, PAISM e, em 1988, garantem o direito ao Planejamento Familiar na Constituição de 1988.
No Brasil, os movimentos feministas garantiram o direito ao Planejamento Familiar na Constituição de 1988
Como resultado das reinvindicações dos movimentos feministas nos anos 80, o Brasil assegurou o direito ao planejamento familiar na Constituição Federal de 1988 mudando o conceito do planejamento familiar. Em 1996, a Lei sobre planejamento familiar, nº 9.263 regulamenta o § 7º, do art. 226 da Constituição Federal. É possível ver nesta Lei a mudança de foco para “direitos reprodutivos”. Atualmente, o Estado dá assistência à saúde integral da mulher, além do direito à concepção e a contracepção.
Veja em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9263.htm
A Ampliação dos Direitos Reprodutivos da Mulher
Em 1996, com a aprovação da Lei nº 9.263, começa a ampliação do planejamento familiar baseado nos direitos reprodutivos da mulher. Em 2004, o governo lança a Política Nacional de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos e, em 2007, subsidia a venda de preservativos e anticoncepcionais a preços menores nas farmácias populares. Atualmente, o planejamento familiar cobre 80% do território brasileiro.
Outras causas da redução na Taxa de Fecundidade Total foram o ingresso da mulher no mercado de trabalho e o rápido processo de
urbanização no Brasil. Nos anos 60, o Brasil era um país predominantemente rural com menos da metade da população (44,7%) vivendo em centros urbanos. De acordo com o Censo do IBGE, em 2010, 84% dos brasileiros vivem em cidades. No campo, além do número elevado de filhos ainda ser visto em algumas regiões como uma vantagem para o aumento da produção de alimentos da família, distâncias grandes de postos de saúde e centro urbanos também dificultam o acesso aos meios contraceptivos. Em regiões remotas do país, técnicos do Ministério da Saúde relatam ainda o uso frequente de plantas abortivas – as chamadas garrafadas – que por serem tóxicas ao organismo humano colocam em risco a vida do feto e, também, da gestante. Ou seja, a vontade da mulher existe, mas falta um meio seguro e eficiente de contracepção. De acordo com o Censo de 2010 do IBGE, são nessas regiões brasileiras onde as taxas de fecundidade total ainda permanecem altas.
Em 2011, o governo anunciou que até 2014 serão criadas 32 Unidades Fluviais de Saúde para atender as comunidades ribeirinhas da Amazônia além da expansão das Unidades Básicas de Saúde no país.
Quanto mais informação sobre os diversos meios contraceptivos, menor o número de esterilizações e abortos
De acordo com a tese de doutorado Reflexão Bioética na Laqueadura Tubária em Mulheres com Desejo de Nova Gestação de 2005 do médico ginecologista Antônio Carlos Rodrigues da Cunha 83% das mulheres que procuraram o Hospital Universitário da Universidade de Brasília (HUB) querendo tentar uma nova gravidez não conheciam as dificuldades para reverter a cirurgia. 91% sequer tinham assinado o termo de consentimento livre e esclarecido para fazer a laqueadura (documento que apresenta os riscos e as implicações do procedimento). Cerca de 47% delas se submeteram à esterilização na faixa de 20 a 25 anos e 35% entre 26 e 30 anos.
Reflexão Bioética na Laqueadura Tubária em Mulheres com Desejo de Nova Gestação
http://www.ambr.com.br/rb/arquivos/42_03.pdf
In Brazil, Women Who Lack Knowledge About Fertility Control Are Those Most Likely to Become Sterilized (No Brasil, mulheres que tem pouca informação sobre a fertilidade são as mais propensas a procurar a esterilização – Instituto Guttmacher)
http://www.guttmacher.org/pubs/journals/3010204.html
Garantido com condicionantes pela Lei do Planejamento Familiar de 1996, a esterilização cirúrgica não deve ser a única opção da mulher e, principalmente, para as mulheres que desconhecem outros meios contraceptivos. Os números ainda são altos, mas já caiu de 40% de mulheres esterilizadas em 1996 para 27% em 2010. Os números de cesarianas também vêm caindo.
Outra questão dramática quando não há um planejamento familiar que informa e dá acesso aos meios contraceptivos, é o aborto clandestino feito muitas vezes sem as necessárias condições de higiene que levam a infecções e à morte da gestante. As vítimas são mulheres pobres que não podem pagar clínicas de aborto ou não têm acesso aos meios contraceptivos. De acordo com o Ministério da Saúde a ação clandestina provoca 25% dos casos de esterilidade, 602 internações diárias por infecções, 9% dos óbitos maternos. Mesmo tendo acesso aos modernos meios contraceptivos vai existir sempre a gravidez indesejada, mas os números caem muito com o uso da pílula, um anticoncepcional bastante seguro.
Quanto mais pílula, menos aborto
http://noticias.r7.com/internacional/noticias/aborto-mal-feito-mata-70-mil-mulheres-por-ano-20091014.html
Mulheres adeptas do anticoncepcional oral têm menos chances de morrer que as não usuárias
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2010/03/13/interna_ciencia_saude,179405/index.shtml
Prática clandestina representa a quarta causa de morte materna no país
http://noticias.r7.com/saude/noticias/abortos-ilegais-no-brasil-podem-ultrapassar-um-milhao-por-ano-20091016.html
Aborto ilegal é maior causa de morte materna em cidades pernambucanas
http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL633197-5598,00-ABORTO+ILEGAL+E+MAIOR+CAUSA+DE+MORTE+MATERNA+EM+CIDADES+PERNAMBUCANAS.html
Aborto malfeito mata 70 mil mulheres por ano
http://noticias.r7.com/internacional/noticias/aborto-mal-feito-mata-70-mil-mulheres-por-ano-20091014.html
Pílula anticoncepcional completa 50 anos com mulheres ignorando preceitos da Igreja
http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u731775.shtml
Abortos ilegais no Brasil podem ultrapassar um milhão por ano. Prática clandestina representa a quarta causa de morte materna no país
http://noticias.r7.com/saude/noticias/abortos-ilegais-no-brasil-podem-ultrapassar-um-milhao-por-ano-20091016.html
Aborto ilegal é maior causa de morte materna em cidades pernambucanas
http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,MUL633197-5598,00-ABORTO+ILEGAL+E+MAIOR+CAUSA+DE+MORTE+MATERNA+EM+CIDADES+PERNAMBUCANAS.html
Aborto malfeito mata 70 mil mulheres por ano
http://noticias.r7.com/internacional/noticias/aborto-mal-feito-mata-70-mil-mulheres-por-ano-20091014.html
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